Estamos em de 2020 com tudo indicando que essa será a década da consolidação da tecnologia BIM (Building Information Modeling) nos diversos processos que envolvem a construção civil em todo o mundo.
A enormidade de benefícios que o BIM possui em comparação com o seu predecessor (o CAD) fica a cada dia mais evidente para uma grande parcela dos envolvidos neste ramo de negócio, dentre eles especialmente projetistas e construtores.
Hardwares, softwares e infraestrutura de rede e internet já há algum tempo não são mais barreiras para esta tecnologia. A resistência geral frente às mudanças e adaptações necessárias ainda perduram, no entanto, tendem a ser cada vez menores frente aos ganhos de produtividade e eficiência que serão os grandes diferenciais para as empresas que adotarem esta nova tecnologia.
No Brasil, este processo de mudança ainda está muito incipiente, praticamente engatinhando. No entanto, tudo tende a acelerar nos próximos anos em função da estratégia governamental de disseminação da tecnologia BIM para uso em projetos e obras públicas. Através do decreto 9377 de maio de 2018 e que teve seu compromisso reafirmado com o novo decreto 9983 de agosto de 2019, foi criado um comitê gestor da estratégia Bim BR que estipulou já para 2021, o marco para contratação, pelo governo federal, de projetos para novas edificações elaboradas inteiramente em BIM. Muito provavelmente este incentivo gerado pela união provocará também um impulso no uso desta tecnologia para o mercado privado.
Mas o que muda para o projetista frente a adoção desta nova tecnologia em nosso dia a dia?
E como este pode se capacitar mais frente a este novo cenário?
É importante frisar que projetar em BIM possui diferenças significativas em relação a elaboração dos projetos em CAD. O projetista que trabalha em CAD desde o início de sua trajetória profissional e que acha que poderá transitar por esta nova tecnologia sem as adaptações adequadas infelizmente está um tanto quanto equivocado.
É preciso um novo olhar para uma tecnologia que nos apresenta uma nova forma de representar e transmitir as informações do universo da construção civil.
Enquanto no CAD elabora-se projetos baseados em desenhos 2D (plantas, seções e elevações, por exemplo), no BIM, trabalha-se criando um protótipo virtual em 3D da edificação que se deseja construir ou reformar. Os diversos elementos deste protótipo são abastecidos com múltiplas informações que podem gerar, com bastante automatismo, as principais representações que antes eram elaboradas de forma manual. No entanto, isto é apenas a ponta do iceberg do que o BIM tem a oferecer.
O modelo em BIM pode, além de conceber e gerar toda documentação necessária para uma construção, ser utilizado para extração de quantitativos de materiais, elaborar o orçamento da obra, planejar as etapas de sua construção, realizar simulações diversas (dentro das quais, simulações do desempenho estrutural ou energético das edificações), auxiliar muito eficazmente na compatibilização entre diversas disciplinas, gerar diversas perspectivas de um empreendimento com uma facilidade ímpar, servir como base para um edifício já pronto (as built), para uma reforma ou para gerenciar seus espaços e ativos, podendo até mesmo auxiliar no planejamento de sua demolição quando no final do seu ciclo de vida.
Todas estas várias possibilidades listadas (e outras que ainda surgirão com o amadurecimento da tecnologia) já são mais que suficientes para demandar grandes mudanças na cultura do projetista com relação a elaboração de seus projetos. Uma maior geração de informação demandará um planejamento muito mais acurado do trabalho a ser elaborado e para cada tipo de uso BIM, o nível de informações a ser gerado irá alterar a estratégia com que deverá ser modelado o empreendimento. Se na época do CAD e até mesmo do desenho a mão as reuniões preliminares entre disciplinas já eram consideradas uma boa prática agora, com o BIM, elas são de fato uma necessidade.
Um projeto de uma edificação, por exemplo, no qual somente será gerada a documentação convencional em 2D demanda um controle proporcionalmente menor no nível das informações do que o mesmo modelo que será utilizado para extrair, de forma organizada, o seu quantitativo de materiais. Por outro lado, ter um modelo preparado para ser orçado por outro projetista em um software BIM distinto do software que foi modelado exige uma comunicação e preparo ainda maior.
Todo cuidado deve ser tomado para que a produtividade prometida pela tecnologia seja realmente atingida e não ocorra o oposto, ou seja, atrasos e retrabalhos em função de premissas insuficientes ou inexistentes.
E a medida que se aumenta os objetivos propostos, a exigência do cliente e o número de profissionais envolvidos, a falta de um planejamento inicial pode significar a diferença entre um trabalho exitoso ou simplesmente, o caos total.
Não é à toa que a maioria dos guia e protocolos BIM internacionais mencionam o chamado BEP (BIM Execution Plan ou Plano de Execução BIM). Nada mais é que um documento que formaliza o combinado entre projetistas, clientes e outros envolvidos (construtores ou investidores, por exemplo) sobre o que será modelado e para que fins este irá atender. Compreender de maneira conjunta as formas como os modelos irão trabalhar em conjunto assim como os momentos adequados de se aumentar o nível de informações e detalhamento de cada uma das disciplinas envolvidas é algo essencial para esta tecnologia seja utilizada com sucesso.
A plataforma BIM é também uma tecnologia que possibilita uma grande colaboração entre usuários que podem visualizar de forma conjunta o rumo que todo o projeto está tomando, fazendo com que observações, apontamentos e soluções vindas de outros projetistas e envolvidos se tornem parte da metodologia. Sendo assim, aquela antiga imagem do projetista que recebe a demanda de seu cliente e trabalha isoladamente até o seu término, sem o envolvimento com demais projetistas contratados, está definitivamente com os dias contados.
Problemas específicos de uma disciplina assim como problemas de compatibilização entre estas são identificados muito mais rapidamente e eficazmente ainda nas etapas mais preliminares dos projetos. O resultado desta nova mecânica de trabalho é que o tempo de duração destas etapas tendem a ser maiores que antes, pelo menos até que os projetos estejam bem alinhados entre si. Em compensação, este tempo costuma ser enormemente recompensado nas etapas posteriores devido à ausência de conflitos graves entre disciplinas e a automatização da documentação que os softwares possibilitam.
Por fim, mas não menos importante, é uma tecnologia que abarca uma quantidade muito maior de variáveis tecnológicas que a anterior. O usuário deverá ser capaz de resolver problemas envolvendo dados e interoperabilidade entre programas que o estará colocando progressivamente cada vez mais próximos do campo de conhecimento da tecnologia da informação.
Entender um mínimo sobre como atributos e parâmetros são criados e ao mesmo tempo, exportados e lidos por outros softwares de outros projetistas seria o mínimo para um trabalho em que se demanda esta integração.
Tudo isto indica que aprender a trabalhar em BIM não significa apenas aprender a utilizar um novo software. Os profissionais que realmente desejam adentrar neste novo universo do conhecimento devem aprender e incorporar uma nova metodologia de projeto, com novas interações entre usuários e envolvidos assim como novos conhecimentos técnicos e novas demandas no fluxo de trabalho.
Será necessário cada vez mais profissionais proativos, interessados e valentes para trilhar esse novo caminho que nos levará a este instigante futuro da construção civil.
Um caminho cheio de possibilidades e que será, certamente, um caminho sem volta.